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quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Corrida de emoções - Crónica da Corrida das Festas da Praia 2025



Expectativa, ansiedade e vontade… Um misto de sentimentos que foram crescendo e foram rodeando os dias e as horas que antecederam a corrida das Festas da Praia de 2025. Foram muitos os que se deslocaram à Ilha Terceira. Cada vez mais, e com base no que é dito por quem nos visita, esta terra é o santuário de algo que vai mais além da “simples” palavra afición. Esta terra é o santuário da taurinidade e tem na Praça de Toiros “Ilha Terceira” a sua Catedral. Uma vez mais, as ganadarias terceirenses de Rego Botelho (RB) Casa Agrícola José Albino Fernandes (JAF) e João Gaspar (JG) estiveram em disputa.

Filipe Gonçalves abriu a tarde com ousadia. A ousadia daqueles que buscam e arriscam logo de início, dizendo “Presente” à chamada do triunfo. O exemplar RB (n°46, 476kg) veio a mais ao longo da lide e mostrou-se colaborante. O Cavaleiro algarvio entendeu o oponente e tirou as devidas vantagens do seu comportamento. Cedo chegou às bancas com um toureio emotivo baseado em ferros com batidas ao piton contrário, cravados em terrenos de compromisso. A destacar, entre outros, o quarto ferro curto: uma reunião aquelas que fazem parar corações. A Corrida abriu assim num patamar superior. O JG (n°34, 472kg), que lidou em segundo lugar, era bonito mas, cedo mostrou alguma debilidade em termos de força, o que fez com que se fosse defendendo ao longo da lide. Aqui, assistiu-se a outro tipo de abordagem. Bem nas bregas e mantendo o tom das cravagens, viu-se um Cavaleiro trabalhador e mais paciente, que procurou contornar as dificuldades do oponente, saindo por cima do mesmo.

Para a montada de Tiago Pamplona, saiu um bonito JG (n°36, 505kg), pleno de trapio. Um bom toiro que se entregou durante toda a contenda. O toureio clássico à portuguesa é uma das formas de arte mais pura e bonita, quando bem delineado e executado. Assim o fez o Cavaleiro da Quinta do Malhinha. Com serenidade e frontalidade, desfrutou do bom toiro que tinha pela frente e rubricou uma boa lide, com cravagens correctas e muita inteligência na escolha dos terrenos. Se o fez com o primeiro toiro, assim o repetiu com o RB (n°57, 431kg). Eficácia com quatro ferros curtos de boa nota, diante de um exemplar que exigia que o conduzissem de forma adequada. O Cavaleiro expôs, novamente, as virtudes do classicismo português ao contornar, gradualmente, as exigências do oponente. De realçar o facto de Tiago Pamplona se ter lesionado, com alguma gravidade, num treino, dois dias antes da corrida e, ainda assim, esteve em praça sem que a assistência percebesse que estava diminuído fisicamente.

Luís Rouxinol Jr. também segurou a Corrida no patamar do triunfo. Regressou à ilha para mostrar o grande momento em que se encontra. É Cavaleiro por valor próprio. Já não é “só” o filho de alguém. O JAF (n°208, 478kg) que tinha pela frente, era bom e pedia contas. Rouxinol interpretou-o com acerto e recriou-se, ferro após ferro. Maturidade e irreverência andaram de mãos dadas fazendo eco nas bancadas, numa lide redonda e triunfante. Com uma grande prestação, viria a fechar a corrida, diante de um belo JG (n°31, 440Kg). O toiro era uma estampa e vinha de largo. Com ele, veio o Cavaleiro com o seu toureio a galvanizar a assistência. Nota de realce para o quarto ferro curto. Saiu de praça sob forte ovação e com o público a pedir mais.

A expectativa também pousou na forcadagem. Grupos de Forcados Amadores da Tertúlia Tauromáquica Terceirense (GFATTT) e Aposento da Chamusca (GFAAC). Pelo GFATTT deu o mote o novel Cabo Bernardo Belerique. Depois de uma primeira tentativa em que foi despejado pelo toiro e saiu tocado, fechou-se à segunda, com valentia, aguentando barbaridades durante a viagem. Francisco Matos, com a eficiência habitual realizou uma boa pega à segunda, sendo bem ajudado pelo grupo. Carlos Vieira fechou-se à primeira com técnica e eficácia, contando com uma grande intervenção do primeiro ajuda Fernando Ferreira. O GFAAC regressou à ilha após 17 anos, numa digressão que despertou muitas atenções. O Cabo João Saraiva pegou à primeira numa rija pega que resultou de uma mistura de querer, força e experiência. Esteve enorme na cara do toiro. Joviano Bettencourt, forcado natural da Terceira, pegou à segunda na Praça da terra que o viu nascer e crescer. Após ter escorregado antes de se fechar na primeira tentativa, realizou de forma correcta uma boa pega que contou com uma primeira ajuda eficaz de Pedro Ribeiro. A Corrida fechou com uma verdadeira aula sobre a arte de pegar toiros. Vasco Coelho dos Reis fez o difícil parecer fácil. Um forcado de eleição que deu lição na arena. Citou, mandou, aguentou, respeitou criteriosamente os tempos do toiro que tinha pela frente e fechou-se de forma perfeita à primeira.

As emoções também estiveram em praça com duas despedidas: Joviano Bettencourt cumpriu o sonho de se fardar e pegar “em casa” e, após esta realização, despediu-se enquanto forcado activo diante das suas gentes que lhe tributaram forte e emotiva ovação. Com a mesma intensidade foi brindado o Bandarilheiro Jorge Silva que, depois de quase 25 anos de alternativa, cortou a coleta e despediu-se das arenas. Um toureiro de muita entrega e humildade que muito contribuiu para a história da tauromaquia dos Açores.

A Corrida foi dirigida, com diligência, por Ricardo Costa, que esteve assessorado por José Paulo Lima. Abrilhantou, com maestria, a Banda da Sociedade Filarmónica Espírito Santo da Agualva.

Bruno Bettencourt

Foto: CMPV



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