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segunda-feira, 6 de abril de 2009

SORTE DE VARAS Para "el toreo de cante grande!"

Uma vez não ter sido possível a minha deslocação à Conferência "Importância da Sorte de Varas", organizada pela Tertúlia Tauromáquica Terceirense, aqui fica o artigo publicado no jornal angrense "A União", da autoria do crítico Mário Aguiar Rodrigues:

A jornada de promoção da importância da Sorte de Varas atingiu os objectivos propostos e desejados pela organização da Tertúlia Tauromáquica Terceirense: a Tenta Comentada na Praça de Toiros Ilha Terceira contou com a presença de duas ou três centenas de aficionados e, à noite, o Auditório da Universidade dos Açores/Pólo da Terceira ficou a “rebentar pelas costuras”, tal a afluência de interessados nas palavras, afirmações e explicações ali transmitidas pelo saber e experiência de António Castañares, escritor e jornalista, João Folque de Mendonça, ganadeiro/criador de toiros, Rafael Trancas, picador, e Gomez Escorial, matador de toiros.

Arlindo Teles, presidente da TTT, situou neste tempo de contestação à Festa dos Toiros a necessidade da iniciativa para uma cabal percepção e defesa do que verdadeiramente está em causa com a mais que provável legalização da Sorte de Varas pelo parlamento dos Açores, abrindo a conferência que prendeu até depois da meia noite as atenções duma plateia ávida de argumentos para cimentar, se tal era preciso, a convicção de que a Festa na Região apenas será grande se puder, efectivamente e à luz da lei e do direito, dispor do instrumento “medidor” da justeza da selecção nas explorações de criação de bravo e, nas praças, revelador da autêntica casta, bravura e qualidade do toiro num ritual - o toureio - que se exige de profundidade e entrega, de parte a parte.

António Castañares recuou no tempo para a perspectiva histórica da Sorte de Varas e a natural evolução do tércio ao longo dos últimos quatro séculos.
Passo a passo, até chegar ao que hoje é a sorte de picar, o escritor espanhol deixou claro que apenas com as varas se atinge o “toreo de cante grande”, afinal o que milhões de aficionados nas praças de todo o mundo procuram e esperam de cada vez que ocupam os lugares nos tendidos.
Na sequência lógica do pensamento e convicções expressas por Castañares, Gomez Escorial, matador de toiros, afiançou que a Sorte de Varas é, afinal, a essência do toureio.

Toda a faena é baseada no acerto dos puyazos concretizados pelo picador. Se porventura o tércio não cumpre, a faena não passará dum sacar de passes, com maior ou menor técnica, com maior ou menor ilusão de beleza e espectáculo, perante um animal que pouco ou nada transmite e exige do toureiro e, logo, não aquece a alma do aficionado, nem entusiasma o espectador.
Rafael Trancas “saiu à praça” para falar do quão difícil é a arte de picar toiros, função onde há que dominar, simultaneamente, o cavalo, o toiro e a vara.

Para o mais requisitado picador português, a selecção do Bravo não faz sentido, nem possui real valia, sem a sorte de picar. A selecção passa pelo uso das varas. O exemplo - disse - está no que de importante se produz com tal prática na Herdade de Adema, na selecção dos famosos e lendários “Palha”, da responsabilidade de João Folque de Mendonça.

Antes de “chegar à corrida”, Rafael Trancas apontou a incongruência da inexistência do primeiro tércio no espectáculo em Portugal na medida em que, para seleccionar com autenticidade, é utilizada a vara de picar. O picador deixou no ar a questão de saber onde está a lógica de não picar os toiros se se picam as garraias...
Já “montado e pronto para exercer a função”, Rafael Trancas explicou como e onde devem ser os toiros picados para que possam ser atingidos os verdadeiros objectivos da Sorte de Varas.
Com propriedade, Trancas revelou que o toiro deve ser picado dois dedos atrás do morrilho, adiantando desde logo que “ só há orelhas se o picador fizer bem o seu trabalho” .
Quanto às vozes daqueles que afirmam que o trabalho do picador é fácil, Rafael Trancas expressou a certeza de que a função é bem complexa pois há que dominar, ao mesmo tempo, o cavalo, o toiro e a vara.

Foi com autêntica paixão que João Folque de Mendonça, ganadeiro/criador de toiros, defendeu o uso e a prática da Sorte de Varas, tanto na criação e selecção de Bravo no interior das ganadarias, como nas praças de toiros.
O responsável da Adema e do ferro “Palha”, para quem a corrida é muito mais que festa e espectáculo, não tem dúvidas de que apenas a sorte de picar pode revelar em toda a verdade e autenticidade o ritual em que o toiro mostra a casta, a bravura e a qualidade na procura da investida (luta) contra a muleta.
Muito ao contrário do que possa ser interpretado como forma de “facilitar” a tarefa do toureiro/matador, a Sorte de Varas desperta o toiro, torna-o mais atento, mais acutilante e perigoso, e, como tal, sublima o ritual, valoriza o espectáculo, emociona o aficionado, no fundo, torna verdadeiro e autêntico o binómio vida/morte, encarado de frente, sem falsos pudores ou morais duvidosas.

A vasta assembleia no Auditório da Universidade dos Açores não se limitou a ouvir falar os mestres. Interveio como se impunha, colocou questões, dúvidas, pediu esclarecimentos sobre um ou outro pormenor, deixando a garantia, e outra situação não seria de esperar, de que a reposição da Sorte de Varas é desejada e com celeridade.

Nesse sentido manifestaram-se também vários deputados açorianos presentes na conferência. De todos os que usaram da palavra sobressaiu a promessa de que, à semelhança do que já haviam feito em 2003, contribuirão com trabalho e voto para a reposição da Sorte de Varas.
Para que se aperceba a noção da importância e abrangência das intervenções dos deputados presentes na plateia do Auditório da Universidade dos Açores/Pólo da Terceira, havia-os de ilhas tão distantes como Santa Maria e Corvo.

Mário Aguiar Rodrigues
in "A União"

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