Há vários fatores que têm ditado o decréscimo de qualidade das touradas à corda, acredita Bruno Bettencourt, autor do blogue Rabo-Torto. A manifestação taurina terceirense tem de ser preservada, diz.
DI - O blogue Rabo Torto é já uma referência no mundo da tauromaquia na Terceira. O que é que o fez avançar com este projeto?
O Rabo Torto - Blogue Tauromáquico surgiu na sequência de um pequeno sítio na internet que eu tinha criado em 2003, o "Sítio da terra". Entre as muitas informações ligadas à cultura terceirense, havia nesse sítio uma secção dedicada a uma das minhas paixões, a tauromaquia. Um pouco mais tarde, numa altura em que os blogues começaram a proliferar, reparei que era mais fácil atualizar informação em formato blogue do que no formato do sítio que eu tinha. A partir daí foi um saltinho e, em outubro de 2006, surgiu o Rabo Torto. Inicialmente a intenção era apenas partilhar aquilo que eu ia pesquisando sobre tauromaquia mas, rapidamente, dei por mim a fazer cobertura noticiosa de eventos tauromáquicos e a escrever crónicas taurinas. No entanto, tal como referi no primeiro post que escrevi, é um espaço sem obrigações e sem pretensões.
DI - Sente, aliás, que há uma lacuna na comunicação social açoriana no que diz respeito à cobertura noticiosa dos eventos tauromáquicos? Afinal, trata-se de um mundo que vive duma linguagem e de símbolos próprios, que é preciso conhecer...
Neste momento não diria que há uma lacuna assim tão grande. Para isto muito têm contribuído as redes sociais e, anteriormente, o "boom" que se verificou ao nível dos blogues taurinos. Uns mantiveram-se, como é o meu caso, apesar de serem mantidos por amadores movidos apenas pela sua afición. Além destes existe atualmente um programa radiofónico semanal dedicado à festa brava, uma página que é mantida no DI e uma revista anual, ambos da responsabilidade da Tertúlia Tauromáquica Terceirense. Esta semana será lançada mais uma revista de cariz taurino e há ainda a cobertura da Feira de S. João que é habitualmente feita pelo DI e os artigos mais virados para a tourada à corda, também publicados no vosso jornal. É preciso não esquecer que até há alguns anos atrás existiu um programa na RTP-Açores dedicado à tauromaquia e desapareceu. Aqui sim, há uma lacuna.
DI - Começa agora, na Terceira, uma época intensa em termos tauromáquicos: começam as touradas à corda e, depois, as corridas de praça. Sente que a Terceira pode oferecer um cartaz único aos aficionados?
A Terceira é, e arrisco-me a dizer, o local do país onde é possível qualquer aficionado assistir à maior variedade de manifestações taurinas. Assim sendo, já é oferecido um cartaz único. Ferras, tentas, touradas à corda, esperas de gado, espetáculos de variedades taurinas, corridas mistas, corridas à portuguesa, corridas apeadas, tudo isto está praticamente ao virar da esquina, à disposição de qualquer um de nós.
DI - E temos sabido aproveitar essa oportunidade?
A divulgação, dentro e fora de portas, tem sido feita. Há que continuar a divulgar. No entanto há que continuar também a preservar o que existe. Falando especificamente da tourada à corda, é crucial não desvirtuar as mesmas tendo em vista um eventual aproveitamento turístico. Esta é, acima de tudo, uma festa feita do povo para o povo. Há sim que sensibilizar quem nos visita para os eventuais perigos das mesmas, por exemplo.
DI - E já que falamos em touradas à corda, é impossível não notar o "boom" de eventos que se tem notado em todas as freguesias. Às vezes, quantidade não é sinónimo de qualidade. Essa premissa também se estende às touradas à corda?
Sem dúvida alguma a tourada à corda não foge à regra. Como já referi, é uma festa feita pelo povo, feita por todos nós. No entanto, a quase banalização deste tipo de espetáculo tem prejudicado o que realmente interessa: a qualidade do que se assiste nos arraiais. Refiro-me não só aos toiros mas também à moldura humana que é essencial neste género de acontecimento. Por vezes acontecem quatro ou cinco touradas num mesmo dia, é natural que o público disperse em demasia. Ao nível dos toiros, pessoalmente já nem sei quantos criadores de toiros existem cá na ilha. O amor pelos toiros, sentido pelos terceirenses, e a ligação ao meio agrícola, trouxe a desvantagem de fazer proliferar o número de criadores em demasia. Muitos dos quais possuem toiros de menor qualidade adquiridos a outros criadores. Este fator aliado a um menor preço cobrado pelo aluguer dos animais reflete-se no nível do espetáculo a que se assiste.
DI - E o que dizer do maior espetáculo taurino dos Açores, a Feira de São João? O cartaz apresentado traz boas surpresas?
Apesar do contexto económico em que se vive, acho que a Feira de São João de 2013 está bem montada. A redução do número de corridas, apesar de ser um fator menos agradável, vem permitir que se mantenha o nível da feira. Em apenas 3 corridas existe variedade de cartéis e nomes grandes do panorama taurino, aliciantes de relevo para quem assiste. Será muito interessante ver a disputa ao nível do toureio equestre entre os nomes Salgueiro, Pamplona e Lopes. No toureio apeado fica a expectativa de assistir às lides de Enrique Ponce, um toureiro que possui uma plasticidade e entendimento que lhe permitem brilhar com qualquer tipo de toiro, assim o queira e assim queiram os toiros. De salientar o facto das ganadarias locais se apresentarem novamente com curros de quatro anos para as lides a cavalo. À parte as corridas de praça, é preciso não esquecer ainda toda a vertente de "tauromaquia popular" que também é parte integrante da feira.
Entrevista: Oriana Barcelos - Diário Insular
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