Dúvidas houvesse, a afluência de
público aos eventos de Feira de S. João 2023 (espectáculos de “tauromaquia popular”
incluídos) são a prova da vitalidade da Festa Brava nesta ilha que é o Coração
da Tauromaquia Atlântica. A anunciada “Grandiosa Corrida Mista”, modelo do
agrado da afición local, não foi excepção: 3/4 de praça para assistir aos desempenhos
de António Ribeiro Telles, Luís David Adame, Joaquim Ribeiro “Cuqui” e do Grupo
de Forcados Amadores da Tertúlia Tauromáquica Terceirense. A completar, os
elementos centrais de toda esta equação que vieram da Caldeira Guilherme Moniz,
ostentando ferro e divisa da ganadaria terceirense de Rego Botelho.
Comecemos pelo curro: seis
exemplares de grande apresentação e seriedade. Manejáveis, revelando bom
comportamento, destacando-se com menos brilho, o quinto da ordem. E se apenas
um toiro é destacado por um menor desempenho, há que dizer que, no caso dos
restantes, por vezes sobrou toiro…. Tanto que se pode e podia ter feito com as
sobras…
Em melhor plano do que na primeira
Corrida da Feira, António Telles abriu praça com uma lide que a espaços foi
chegando à assistência. Diligente na escolha de terrenos, foi corrigindo a mão,
alcançando cravagens de boa nota e com verdade. Frente ao quarto da ordem, ao
qual cravou à porta-gaiola, esteve num patamar superior. Tirou partido do toiro
e foi cravando em terrenos de compromisso com destaque para o 2º ferro curto,
ao estribo e à boa maneira portuguesa. Quando a lide caminhava para o final,
pediu autorização e chamou à praça o outro António, o filho que era seu “sobressaliente”
na corrida. Uma surpresa para a assistência e um momento bonito, apanágio dessa
universidade que é a Herdade da Torrinha. Pena as cravagens não terem resultado
em pleno e no ritmo expectável. Terão pecado pelo prolongamento da função,
apesar de se perceber o entusiasmo. No final, um “Centurion” (nº2, 495Kg) que
muito jeito teria dado às tropas de César: aguentou a cravagem de 11(!) arpões
e nunca virou a cara, investindo sempre de forma franca.
Pegas do GFATTT frente a toiros
sérios. Francisco Matos resolveu à quarta tentativa, a sesgo e com ajudas
carregadas, após tentativas em que aguentou duros derrotes por baixo de um
sério “cinqueño” que foi aprendendo e descompondo o grupo. Bernardo Belerique
havia de trazer a chave dourada para trancar em beleza esta Feira dos 50 anos
do “grupo da tertúlia”. Uma pega daquelas que não se esquecem: saída pronta do
toiro, o forcado a aguentar-se e a fechar-se no momento certo. Uma vez mais,
Fernando Ferreira “Mangueira” a mostrar o porquê de ser um primeiro ajuda de
referência na forcadagem deste país: no momento certo, e irrepreensível, a
possibilitar o consumar de uma pega de querer. Após ser levado até às tábuas, o
forcado da cara aguentou a fuga do toiro que pareceu interminável, até o grupo se
fechar de forma triunfal. Duas voltas para Belerique, sendo acompanhado na segunda,
a pedido da assistência, pelo “bom gigante” Fernando Ferreira.
Luis David Adame pisou a arena angrense
15 anos depois do seu irmão Joselito. O Matador mexicano mostrou recursos com o
Capote, quer na lide dos seus toiros, quer indo ao quite nos toiros do companheiro
de cartel. Verónicas, Chicuelinas, Largas de Joelhos, Tafarellas, Calecerinas e
Zapopinas foram desenhadas pelo capote de forro azul-celeste. Bastante desluzido
com as bandarilhas, empenhou a muleta e começou, por Derechazos, a traçar uma
lide que teve momentos de interesse e temple artístico, ficando as vistosas
Manoletinas com que encerrou. Ficou por explorar com mais afinco o lado
esquerdo do oponente. Frente ao segundo do seu lote, destaca-se o desempenho de
João Pedo Silva, com dois grandes pares de bandarilhas e de Diogo Coelho com
igual prestação empunhando a parelha de ferros. O Matador baseou a (quase) lide
na mão direita. A registar a entrega do matador que, apesar de tudo, não
conseguiu séries com grande ligação, mercê de um exemplar que saía desligado. O
toiro foi escolhendo os terrenos e o Matador acabou a citar à porta dos curros,
terminando com pouca história.
Joaquim Ribeiro “Cuqui” procurou
meter-se na disputa pelo triunfo, nesta sua apresentação de “luces” em Angra do
Heroísmo. Com o Capote, entre outros lances já referidos acima, destaca-se a
quietude e o poder das suas Verónicas. Compartilhou o tércio de bandarilhas com
Fernando Fetal que esteve na ilha Terceira para prestar prova de Alternativa de
Bandarilheiro. Fetal esteve superior no primeiro e terceiro par cravado. Cuqui
deixou boa nota, explanando a plasticidade do seu toureio. Lidou por ambos os
lados, destacando-se uma bonita e cingida série de Naturais. A cada passe foi
ficando cada vez mais profundo e templado, diante de um toiro que se entregou
de pronto e com recorrido, a pedir mais. Diante do último exemplar da corrida,
esteve desinspirado com as bandarilhas, recorrendo a um último par "de violino" para procurar compensar os lapsos anteriores. Na saída do tércio, não se livrou
de um momento de apuro, tendo sido levado por terra diante das hastes do
oponente. Terá sofrido um “puntazo” no glúteo direito. Não acusou o toque. Mostrou
recursos toureiros, indo de encontro ao que de melhor tinha este “Czar” (nº98,
533Kg) de Rego Botelho. Lide variada com as duas mãos a fazer soar tímidos “Olés”
na assistência. No final, recolheu à enfermaria pelo próprio pé.
Corrida dirigida por Mário
Martins, sendo assessorado pelo médico veterinário Vielmino Ventura. A
abrilhantar, brilhantemente, a Banda da Feira de S. João sob a batuta do
Maestro Durval Festa.
Uma nota para a organização desta
Feira de S. João 2023, a Tertúlia Tauromáquica Terceirense em parceria com a
Câmara Municipal de Angra do Heroísmo. Uma feira bem montada e triunfal em
termos de assistências registadas, mantendo-se como um certame de referência no
panorama taurino nacional e renovando o constante pulsar deste Coração da
Tauromaquia Atlântica.
Oportunamente serão anunciados os
nomes dos vencedores dos troféus da Feira: Bravura, Apresentação, Melhor pega,
Melhor lide a Cavalo, Melhor lide apeada e Triunfador da Feira.
Bruno Bettencourt
Foto: Fernando Pavão