About

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Bom Natal e bom 2013


Postal de Natal - G. F. A. Ramo Grande


Postal de Natal - Naturales



quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Tragédia com turista pode despromover a ilha

O início das touradas à corda na ilha Terceira perdeu-se na memória dos tempos. É uma tradição que tem passado levemente incólume a adjetivos como "barbárie", "crueldade" ou "atrocidade", entre outros. O que é facto é que as touradas à corda são efetivamente muito distintas das touradas de praça, e os atores em presença, também são completamente diferentes. Sendo assim, justifica-se ter como objeto de estudo a tourada à corda, pois a ela estão hipoteticamente associados benefícios económicos, não devidamente contabilizados, benefícios ambientais de preservação de espécies, também não devidamente calculados, para além do interesse turístico, ainda não mensurado.
As touradas à corda como atividade cultural são frágeis, porque estão sujeitas a juízos morais e a acontecimentos imprevisíveis, o que as tornam especialmente vulneráveis em termos de continuidade. Basta haver um acidente grave com um turista que não foi devidamente esclarecido para que ocorra a despromoção turística da ilha e como tal, originar prejuízos económicos.

Todos assumimos que a exposição ao risco físico na tourada à corda é voluntário, mas é necessário um melhor entendimento das opiniões, do conhecimento e das percepções de risco dos vários participantes nas touradas à corda, para se gerar uma mensagem de risco adequada e eficaz, tanto para os turistas como para os locais, de modo a que sejam corrigidas atitudes e comportamentos de todos os que nela participam. Ora, como afirmam alguns autores, as "abordagens que se focam essencialmente na percepção do perigo e nas representações mentais dos riscos, ajudam a perceber a capacidade que as populações têm de anteciparem e de lidarem com o risco", e isso é importante, pois é em larga medida com base nestas questões de carácter intersubjetivo que as pessoas tomam decisões susceptíveis de as colocarem numa situação de maior ou menor exposição aos perigos. Para os turistas por exemplo, à semelhança do que acontece com os americanos instalados na Base das Lajes, há necessidade de comunicar eficazmente o que é uma tourada à corda, com vista a controlar o risco e a coloca-lo claramente no domínio das liberdades individuais, ou de outro modo, que a exposição ao risco seja informada e voluntária. Assim sendo, a Comunicação de Risco deverá ser um processo interativo e deliberado de troca de informação sobre riscos e dirá respeito à sua natureza, gravidade e aceitabilidade. É nesse contexto que a tese de mestrado em apreço aparece.
 

Capinhas são quem tem mais perceção do risco

Os capinhas são os que mais perceção têm do risco que correm numa tourada à corda, mas isso não os impede de enfrentarem o toiro. As diferentes noções de risco neste cenário estão no centro de uma tese de mestrado em Engenharia do Ambiente, assinada por Carina Mendonça, no âmbito da Universidade dos Açores.
De acordo com a tese, o público é o que se sente mais seguro: "Contrariamente aos capinhas, o público é o grupo que está menos exposto ao risco, e que por sua vez percecionou riscos menos elevados, tendo havido
por parte destes uma negação de risco. Esta negação faz com que seja um grupo com perceções atenuadoras de risco, crendo-se haver aqui, uma grande influência cultural na perceção de risco das touradas à corda".
Religião e cultura são algumas das bases da coragem dos capinhas. "A perceção de risco dos capinhas parece ser afetada pela cultura, religião, baixa autoestima e valores morais e ambientais, que no seu conjunto originam comportamentos baseados na aceitação do risco. No caso das elevadas representações religiosas dos capinhas, parece haver o domínio do risco pelo sagrado. Associada à perceção de risco dos capinhas, está a valorização afetiva do animal", pode-se ler.
Carina Mendonça considera que a posição mais fácil de explicar é a do público e a mais complexa a dos capinhas. "Verificou-se que, quanto maior o grau de exposição/vulnerabilidade dos grupos ao risco das touradas à corda, maiores foram as perceções de risco. Associadas às perceções de risco mais elevadas, pareceram estar a boa visibilidade e aceitação desses riscos. O facto de haver por parte do público uma atenuação de risco, pressupõe que possam existir comportamentos, que colocam impedimentos ao curso de ações preventivas mitigadoras desse risco", sustenta a tese de mestrado.
Em conversa com o DI, Carina Mendonça resumiu: "Quanto maior é a exposição ao risco, maior perceção existe. No caso do público, por conseguir escolher o nível de exposição ao risco, provavelmente esta não é uma preocupação acentuada".
 
Ganadeiros e pastores
A tese de mestrado foca também a perceção do risco em grupos como os pastores e os ganadeiros.
"No caso dos ganadeiros, a perceção de risco pareceu ser afetada pela elevada autoestima, fatores económicos, culturais e familiares. Este grupo omite o risco e atenua o risco, a que os outros estão sujeitos. Também neste grupo se verificou a existência da valorização afetiva do animal", escreve Carina Mendonça.
Já no caso dos pastores "a cultura e a existência de uma profissão de risco, no que diz respeito à lide do touro no pasto, são fatores que parecem alterar a perceção".
Segundo Carina Mendonça "estes percecionaram riscos mais elevados, conforme estivessem mais vulneráveis a esse risco (maior perceção de risco na lide do touro no pasto, do que na lide do touro durante uma tourada a corda), havendo por parte dos pastores, uma atenuação do risco dos outros intervenientes na festa e uma amplificação do risco pessoal".
Os turistas
Carina Mendonça acredita que o forte enraizamento das touradas à corda na cultura terceirense pode levar a uma desvalorização dos perigos. "Provavelmente por isso, a informação sobre o risco físico inerente às touradas à corda seja assunto colocado para segundo plano. Refira-se, por exemplo, que a morte acidental de um turista, por falta de informação sobre o que envolve a festa, mais precisamente o risco a que se submete, poderá ter impactos muito negativos em termos de promoção turística da ilha", argumenta.
A aluna da Universidade dos Açores sustenta que, "neste contexto, uma informação de risco acoplada à visão tradicional do que a tourada oferece seria uma mais-valia para a 'festa brava' e para a promoção da ilha no estrangeiro do ponto de vista turístico, admitindo que estas atividades continuarão a ser socialmente aceites".
Estratégias
A tese de mestrado sugere várias estratégias informativas no campo do risco associado às touradas à corda. "Deve ser transmitida, essencialmente a turistas, informação que clarifique o risco inerente às touradas à corda, focando: riscos físicos (risco de morte, risco de ferimentos e risco de invalidez); riscos de perdas de bens (risco de danos em automóveis, em habitações, outros danos materiais) ou fatores que contribuem para o aumento do risco físico (desconhecimento da tradição e da opulência do touro, distração, embriaguez, ruído, pânico, lançamento de foguetes, resíduos abandonados, elevada concentração de pessoas, exposição/vulnerabilidade)", avança o texto.
Seria necessário "destacar o facto de não existirem garantias de segurança numa tourada à corda, pois apesar dos esforços dos intervenientes, todos estão perante um animal bravo, o qual é difícil de controlar".
"Essa informação pode ser veiculada pela televisão, pelos jornais, revistas, internet ou em panfletos informativos distribuídos nos limites dos arraiais num dia de tourada, oferecendo aos que desconhecem o evento a ideia do que pode encontrar numa tourada e as precauções a tomar", afirma Carina Mendonça.
Do ponto de vista da autora da tese de mestrado, "seria pertinente também estudar questões relacionadas com a valorização económica das touradas à corda e investigar a função do touro numa perspetiva de gestão e conservação da natureza".
De acordo com Carina Mendonça, a anterior falta de estudos que analisassem a perceção de risco nas touradas à corda e a importância que este fenómeno cultural tem no espaço terceirense e também açoriano conduziram à realização deste estudo.~
 

Twitter Delicious Facebook Digg Stumbleupon Favorites More